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Ecossistemas de Inovação

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Ecossistemas de Inovação

O termo ecossistema tem sido utilizado em diferentes contextos quando nos referimos a pesquisa e a gestão na área de administração, contudo o termo pode ser confundido facilmente com os ecossistemas ecológicos que de certa forma diferem em comportamento daqueles focados nos ambientes de negócios.

Para um ecossistema ecológico funcionar você precisa incluir todos os seres vivos que afetam o ecossistema e deixar que ele entre em equilíbrio naturalmente, alterações drásticas neste ecossistema podem destruí-lo se não forem controladas adequadamente.

Na natureza o equilíbrio entre presas e predadores permite uma oscilação natural na quantidade de cada um, quando existem muitos leões e poucos antílopes, a população de leões começa a diminuir e a de antílopes crescer, quando ela aumenta a população de leões volta a crescer e o ciclo recomeça. Quando adicionamos o fator homem, que caça os leões por diversão, podemos ter a extinção de uma espécie e a proliferação da outra, com o aumento dos antílopes, a vegetação pode reduzir e outras espécies que dependem desta vegetação podem desaparecer também.

Enfim, em um ecossistema natural podemos considerar que a não influência do homem ou outro ser vivo que o contamina pode contribuir para a sobrevivência das espécies contidas naquele ecossistema.

No ambiente organizacional isso não ocorre da mesma forma, porém as inter-relações entre diferentes atores ainda é extremamente forte e pode incluir, mas não se limitar a empresas, fornecedores, clientes, usuários, governos, instituições de pesquisa e ensino, universidades, bancos, investidores, trabalhadores, sindicatos, entre outros agentes.

Existem diferentes ecossistemas, mas neste artigo vamos os debruçar sobre o tema inovação e desta forma, podemos considerar um ecossistema de inovação como uma rede de organizações interconectadas em torno de uma empresa central ou uma plataforma, que incorpora tanto o lado produtivo quanto do usuário, e cria e se apropria de novos valores através da inovação.

Qual a diferença desta definição para outras que envolvem o relacionamento de diferentes atores?

De forma geral os ecossistemas de inovação fazem parte das teorias de redes, contudo algumas estruturas de rede que focam em apenas alguns atores, como a relação entre empresa e fornecedor, ou empresa e cliente, apresentam apenas parcialmente os atores que estão muitas vezes envolvidos ou que influenciam esta relação. Uma visão de ecossistema permite adicionar diferentes atores com papel de influenciar e mediar a relação que existe entre as diferentes organizações.

Um outro ponto importante de observar estas redes de inter-relações como ecossistemas é que percebemos o quão dinâmicas e intencionais elas são e como os participantes co-criam valor em conjunto.

Nesta perspectiva, as capacidades dos participantes do ecossistema evoluem em conjunto em torno de um conjunto de tecnologias e cooperação e competem para dar suporte a novos produtos, para a satisfação do cliente e, eventualmente, incorporam o próximo ciclo de inovação. Isso torna os ecossistemas arranjos colaborativo com o objetivo de criar valor que sozinhas estes atores não conseguiriam. O ecossistema amplia o entendimento de cadeia de valor que era composta por fornecedores e distribuidores e amplia de maneira tridimensional ou mais as relações de uma organização.

Esta pluralidade de participantes, papéis e interdependências implica em desafios que não estão igualmente distribuídos entre os participantes. Esta pluralidade também levanta questões de governança do ecossistema, ou seja, quem é coordenado e quem faz a gestão do ecossistema? É necessário que exista governança para o funcionamento do ecossistema? Como os diferentes níveis de poder influenciam o ecossistema se existe um coordenador central?

Uma boa parte da literatura sobre o tema entende que as plataformas servem como artefatos de coordenação que o grupo de empresas utiliza, ou como os serviços, ferramentas e tecnologias que outros membros do ecossistema usam para aprimorar sua própria performance.

Independente do sistema de governança utilizado, ele é central para a saúde e estabilidade do ecossistema, e quando no começo do texto salientamos que em um ecossistema biológico o melhor é deixar que tudo se estabilize naturalmente, em um ecossistema de inovação é preciso ter um ou um grupo de atores centrais que a todo momento vai estar desequilibrando o ecossistema para que ele continue se movendo e evoluindo.

E neste ambiente de movimento surgem três temas centrais que buscam compreender os ecossistemas de inovação, sendo eles a:

1) criação de valor;

2) imersão da rede; e

3) gestão da rede.

Criação de valor

A criação de valor pode utilizar diferentes estruturas de rede para conectar atores distintos para criar valor conjunto ou para terceiros. O modelo mais conhecido é o de cadeia de valor de Porter, que apresenta uma estrutura vertical e sequencial de criação de valor do ponto de vista da empresa principal. Contudo este modelo já não explica tão bem a criação de valor quando adicionamos mais atores que estão fora da estrutura vertical da empresa.

Um destes modelos de criação de valor é o de constelações, elaborado por Normann e Ramirez (1993), e que define as constelações de valor inovador como a identificação de atores econômicos e conecta eles em novos padrões que permitem a criação de novos negócios que não existiam previamente, ou mudam a forma como certos tipos de valor são criados.

Neste modelo a lógica de criação de valor é enfatizada para um contexto não linear de sistemas, onde o objetivo é inovar através da co-criação de valor com fornecedores, parceiros, aliados e clientes. A motivação central para uma constelação é a de que um único ator desta estrutura não consegue criar e capturar valor sozinho e que o valor gerado pela estrutura será dividido entre os diferentes atores participantes da constelação.

Um outro modelo é o de valor líquido (value net). O valor líquido é uma rede dinâmica e colaborativa que combina as competências de cada participante. A rede de valor líquido se forma em torno dos clientes, capturando as escolhas do consumidor em tempo real em um esforço para satisfazer sua demanda atual. De forma geral este tipo de rede tem como único objetivo atender a demanda do cliente, assim que esta demanda for sanada a rede se dissolve, principalmente por que a próxima necessidade do cliente pode envolver competências diferentes e assim, atores diferentes serão necessários para compor a próxima rede de valor líquido.

Existem alguns outros modelos de redes de criação de valor, mas seu objetivo é o mesmo, explorar estrutura diferentes das tradicionais verticais para gerar valor para os diferentes atores participantes da rede.

Imersão da Rede

O temo imersão vem do inglês Embeddedness e é mais difícil de traduzir do que parece. Esta “imersão” faz referência a fatores estruturais e relacionais dos participantes da rede, ou seja, quais as conexões que existem entre estes atores e qual o tipo destas conexões. Imagine sua rede social, de forma geral você está conectado a diversas pessoas em contextos diferentes, em casa, na família, no trabalho, nas escola, no clube e em outros contextos, em cada um destes contextos você possui relacionamentos diferentes, alguns são íntimos, outros de negócios, alguns mais formais que outros e assim por diante.

Como você está conectado com as pessoas (estrutura) e o tipo de relacionamento (tipo) implicam em como você se relacionada com cada ator da rede, a quais recursos tem acesso, quais os resultados espera de cada relacionamento e como você usa a estrutura da rede e os relacionamentos a seu favor para capturar valor. Em uma rede de empresa não é diferente.

A temática principal busca entender como os participantes do ecossistema podem conquistar vantagens da melhor forma do ecossistema de inovação como um todo. O ativo destes ecossistemas está centrado nos relacionamentos, pois são estes que geram valor para os participantes.

Assim como outras redes os desafios são diversos e envolvem a construção do relacionamento entre atores, as dimensões de poder e controle de cada ator sobre a rede, a mitigação do abuso da rede por parte de algum participante com único interesse individual, ou seja, a governa da rede como um todo. Balancear os benefícios com os perigos da dependência demanda o desenvolvimento de ativos que mitiguem o oportunismo dos participantes.

Por esta razão que os objetivos comuns desempenham um papel fundamental neste tipo de ecossistema, pois se todos os atores não conseguirem de uma forma ou de outra alinharem objetivos comuns que, até podem levar a resultados individuais diferentes, cada um pode puxar para o lado oposto e os benefícios da rede desaparecem por completo podendo até impactar negativamente no resultado individual dos participantes.

Em razão da estrutura e do relacionamento serem ativos importante destes ecossistemas, qualquer mudança nos participantes ou na estrutura da rede podem trazer diferentes impactos para a rede como um todo. No momento que um ator deixa, por exemplo, de ser o líder da rede para a entrada de outro, a estrutura muda, assim como o tipo de relação que existia com o líder antigo não pode simplesmente ser repassado para o novo líder e fatores como poder e confiança, devem ser desenvolvidos novamente e, na maioria dos casos, partindo do zero, o que nos leva ao próximo tema.

Gestão da rede

Afinal de contas, como as organizações podem proativamente realizar a gestão do ecossistema de inovação ou da rede de negócios? Para que a gestão do ecossistema seja possível é preciso aceitar que as estruturas interorganizacionais foram deliberadamente criadas para propósitos específicos e existem coalisões de empresas autônomas, mas interdependentes que estão dispostas a coordenar alguma de suas ações e submeter parte de suas atividades e decisões a um controle centralizado com o objetivo de alcançar objetivos que são maiores do que aqueles que conseguiriam sozinhos.

Neste modelo os atores podem contemplar diferentes entidade e inclusive organizações concorrentes, naquilo que Nalebuff e Brandenburger (1996) chamam de co-opetição. A co-opetição tem como objetivo balancear os fatores de competição e cooperação para maximizar os resultados da rede.

Para que a gestão da rede seja possível, três fatores agem como condições limitantes para que uma empresa desenvolva a habilidade de gerenciar a rede, sendo: a) a empresa central deve ter a habilidade de influenciar e controlar as atividades de valor da rede e os demais participantes; b) deve existir um alinhamento suficiente entre os objetivos da rede com os diferentes objetivos específicos e individuais de cada ator participante; e c) a estrutura da rede deve ser passível de coordenação, como por exemplo um hub-and-spoke, que compreende diversos pontos periféricos conectados a um ponto central. Este tipo de estrutura permite uma gestão que não seria possível em uma rede sem a posição de um ator central.

Em resumo, os modelos de gestão da rede tem buscado formas de gerenciar o ecossistema de inovação onde a organização está inserida, aproveitando a estrutura e suas relações de forma estratégica para obter resultados para todo o ecossistema, contudo ainda existe muito a ser feito no sentido de descobrir como as empresas podem proativamente moldar os ecossistemas de inovação para sua vantagem própria.

Assim como tão recente são os estudos dos ecossistemas de inovação, também é recente o conceito de como as empresas podem proativamente criar, conduzir e alavancar os ecossistemas de inovação para melhorar sua performance em inovação.

E para isso muitos testes e pesquisas ainda precisam ser conduzidas. E para você, qual é o futuro dos ecossistemas de inovação?

 

Texto produzido com base em (Mercier-Laurent, 2014)

MERCIER-LAURENT, E. Innovation Ecosystems. In: DODGSON, M.; GANN, D. M.; PHILLIPS, N. (Eds.). . The Oxford Handbook of Innovation. Montreal: Oxford University Press, 2014. p. 1–21.