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O poder das Plataformas

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O poder das Plataformas

Provavelmente você já se deparou com o termo plataforma mais de uma vez e o que ela é. Talvez já tenha este conhecimento e esteja pensando em como desenvolver a sua plataforma de negócio na sua empresa ou na criação de um novo negócio baseado em uma plataforma. As plataformas tem se transformado em grandes motores da inovação, mas elas não são tão simples quanto parecem.

Este artigo vai lhe ajudar a entender o que é uma plataforma e como colocar em prática este fenômeno que está transformando a economia e a vida das pessoas, mas para isso vamos começar entendo do que estamos falando.

O que é uma plataforma?

A maneira mais fácil de explicar o que é uma plataforma é através de exemplos: Facebook, YouTube, Amazon, eBay, Alibaba, Wikipedia, Twitter, Instagram, AirBnB, Uber, iFood, Spotify, entre várias outras.

Todos estes são exemplos de plataformas e se você observar atentamente o principal objetivo destas plataformas é o de conexão, ou seja, facilitar na interação entre duas ou mais pessoas. O Facebook conecta pessoas, o Alibaba conecta compradores e fornecedores, o AirBnB conecta proprietários de imóveis e pessoas buscando hospedagem, o Uber conecta motoristas a passageiros.

Estas conexões permitem que as pessoas troquem valores, o YouTube permite que um produtor de conteúdo entregue valor para alguém que busca conhecimento. A Amazon facilita a troca de produtos dos fornecedores por dinheiro dos clientes.

Um outro ponto em comum entre estas plataformas, e todas as outras que você pensar, é o uso de tecnologias que ajudam nestas conexões, para que elas sejam realizadas de forma precisa, rápida e simples. Através das tecnologias é possível eliminar as barreiras de tempo e espaço.

Cada uma destas plataformas tem um foco muito claro e atua em indústrias e mercados únicos e distintos, contudo, talvez o ponto mais importante das plataformas é que elas atuam sobre a informação. Então podemos dizer que qualquer indústria que a informação é um ingrediente importante é candidata para se tornar uma plataforma.

Qual o propósito da plataforma?

Eu diria que é: encontrar afinidade entre os usuários da plataforma e facilitar a troca de bens, serviços ou moeda social, permitindo a criação de valor para todos os participantes.

Em uma indústria tradicional existe uma cadeia de valor que precisa ser utilizada para que a informação e os valores fluam de maneira a alcançar todas as partes interessadas. Primeiro a empresa projeta e fabrica um produto, então lança no mercado e faz a logística para disponibilizar nas prateleiras de uma loja, a loja espera o cliente comprar para então entregar parte do valor para o fabricante.

Uma plataforma tem potencial de ganhar escala mais eficientemente porque elimina várias das barreiras do modelo linear de criação de valor. No mercado publicitário o processo de publicação de um livro era lento. Era preciso que o editor escolhesse os livros que seriam publicados, fizesse a impressão e disponibilizasse para o mercado. Nem todos os títulos poderiam ser publicados, pois havia uma limitação de recursos, e no final o editor tinha que torcer para ter escolhido os títulos que fariam sucesso.

Com o Kindle da Amazon cada escritos pode publicar imediatamente o seu livro, estabelecer o preço, verificar o interesse do público e, se necessário, fazer os ajustes necessários de valor, além de ter o feedback em tempo real sobre o sucesso ou não do seu livro. Esta liberdade permitiu eliminar boa parte do trabalho, garante mais liberdade para os autores e maior variedade de títulos para os leitores.

Para uma rede de hotéis crescer ela precisa construir ou adquirir um novo hotel. E para o AirBnB crescer, qual a estratégia? Basicamente, assim que houver demanda em uma determinada região o mercado de proprietários locais vai disponibilizar casas, apartamentos e quartos dentro da plataforma. Qual a diferença de custo para expansão da rede de hotéis e do AirBnB?

O Uber é a maior empresa de táxi e não tem nenhum carro. O Facebook é a maior empresa de mídia e não cria nenhum conteúdo. O AirBnB é o maior provedor de acomodações e não tem nenhuma propriedade. Alibaba é o maior varejista e não tem um único item em seu inventário. Esta é a lógica das plataformas.

O que você vai fazer?

Praticamente todas as áreas de gestão – estratégia, operações, marketing, produção, pesquisa e desenvolvimento, recursos humanos – estão apreensivas com este novo modelo de se fazer negócio. O conhecimento em plataformas se tornou uma competência necessária para as lideranças, e apesar disso, muitos líderes continuam tentando enfrentar este “vilão”, quando na verdade deveriam estar lutando para compreender e se apropriar do valor que as plataformas possibilitam criar.

Um dos principais conhecimentos que estes líderes devem ter é como a plataforma cria valor. Se você lembra, falei anteriormente que uma plataforma permite a conexão entre pessoas, organizações e recursos. As organizações são feitas de pessoas, então o objetivo é conectar pessoas. Os recursos são os itens que são trocados entre as pessoas, que podem ser produtos, serviços ou moeda. Então se conseguirmos conectar pessoas, o resto vai naturalmente acontecer por si só.

Nos próximos parágrafos nós vamos entender como a conexão entre as pessoas, ou atores, vão acontecer.

Existe uma piada que se diz que o prêmio de melhor vendedor do mundo deveria ir para a pessoa que vendeu o primeiro telefone. Qual o valor de ser a primeira pessoa no mundo em ter um telefone? Absolutamente nenhum. Para que serve um telefone se você não tem para quem ligar?

Este é o chamado efeito rede. Agora vamos imaginar que existe uma segunda pessoa no mundo que acaba de comprar um telefone. Na figura abaixo é possível ver que agora existe um pouco mais de valor em se ter um telefone. Mas este valor não está nas pessoas, mas na conexão que é possível fazer entre estas pessoas.

Agora vamos expandir um pouco mais o nosso modelo. Com 3 pessoas com telefone, temos a possibilidade de fazer 3 conexões. Com 4 pessoas, existem 6 conexões possíveis e a rede de telefones ganha mais valor. Com 5 pessoas são possíveis gerar 10 conexões. Desta forma temos que o número de conexões possíveis varia conforme a quantidade de pessoas/atores na rede conforme a expressão abaixo:

Se 100 pessoas comprarem telefones, então temos 4.950 conexões possíveis. O que isso significa na prática?

Se uma empresa vende seus produtos localmente ela pode atingir todas as pessoas a sua volta. Em uma cidade de 100.000 habitantes, esta pode ser a quantidade de conexões que a empresa pode fazer.

Mas e se a empresa decidir entrar em uma plataforma com 10.000.000 de usuários, quantas oportunidades a mais de negócio ela conseguiu? Este é o efeito das plataformas, que como salientei anteriormente permite vencer as barreiras de tempo e espaço.

Por que é importante compreender este efeito de rede?

Sem os atores/pessoas, não será possível gerar as conexões e a rede não tem valor. Em uma plataforma sem usuários, não é possível gerar as conexões que irão gerar valor e a plataforma não vai se desenvolver. Este é um ponto fundamental no sucesso de uma plataforma e deve ser estudado como parte da estratégia de criação do modelo de negócio que se está desenvolvendo.

O sistema operacional Android pode exemplificar outro efeito de rede importante para o sucesso de uma plataforma, que vamos chamar de efeito de rede de dois lados. Um dos lados é o dos clientes e o outro dos fornecedores.

Conforme as pessoas usam o sistema Android, começam a surgir desenvolvedores interessados em criar aplicativos para Android. A plataforma então fica mais atrativa para que outros usuários queiram participar e novos clientes são atraídos. Como aumenta o número de clientes, novos desenvolvedores percebem oportunidades de gerar valor na plataforma e desenvolvem e lançam seus apps para Android e se cria um ciclo virtuoso de atração de usuários/clientes e desenvolvedores/fornecedores. Cada dia que passa faz com que a plataforma Android tenha mais e mais valor para todos que estão dentro dela em função do aumento exponencial do número de conexões possíveis.

Este é o mesmo efeito que ocorre em uma casa noturna que oferece entrada grátis para mulheres nas quintas-feiras, se elas forem a festa, existe a tendência de mais homens irem, ficarem felizes e pagarem por suas entradas. Homens, mulheres e o proprietário do bar criam valor mutuamente.

Este é o efeito positivo das redes, mas existe também os efeitos negativos que podem levar os atores embora da plataforma e implicar no fracasso do modelo de negócio.

Efeitos negativos das redes

Como comentei o objetivo da plataforma é fazer conexões entre os atores, mas se estas conexões começarem a ser realizadas e não criarem valor para as partes envolvidas, elas podem abandonar a plataforma. Isso implica que nem todas as conexões possíveis de se fazer podem ser desejáveis e em muitos caso pode ser necessário filtrar quais conexões serão permitidas.

Quando as conexões que são feitas não geram valor, os clientes saem da plataforma, com menos clientes os fornecedores também abandonam ela e, quanto menos fornecedores, mais os clientes não veem valor e vão embora até que a plataforma morre completamente.

Para resolver este problema de conexões é preciso filtrar quais conexões devem ser feitas. Em uma plataforma isso é feito pelo algoritmo, mas o dilema é que sem dados é difícil de acertar o algoritmo, então, principalmente no início da plataforma, o desenvolvimento iterativo e constante é ainda mais importante.

Imagine que toda vez que você acessasse o YouTube e fizesse uma busca por um determinado assunto a plataforma lhe recomendasse vídeos com conteúdos que não atendem a sua necessidade. Em pouco tempo você deixaria de utilizar a plataforma.

E por que as pessoas estão deixando de usar a plataforma os criadores de conteúdo também iriam perder o interesse, pois não recebem as visualizações que gostariam. Sem visualizações as empresas não pagam para colocar anúncios nos vídeos e a plataforma não consegue retorno financeiro para manter o serviço no ar.

Em qualquer plataforma é indispensável que a afinidade (fit) nas conexões entre atores seja controlada e otimizada, pois é este fit que vai garantir que os atores mantenham seu interesse na plataforma.

Efeitos cruzados

Um outro problema que surge quando falamos em redes é a influência dos diferentes lados da plataforma. Como comentei, geralmente existem dois lados, um dos clientes e outro dos fornecedores (mas em outros casos podem haver mais lados).

Quando os efeitos estão do mesmo lado, o ideal é garantir a atração dos atores daquele lado. Em jogos de vídeo game online, quanto mais amigos tivermos para jogar juntos, maiores as chances de que outros amigos entrem e de que joguemos aquele jogo por mais tempo.

O efeito negativo do mesmo lado ocorre, por exemplo, quando existem muitos fornecedores concorrentes em uma mesma plataforma. O cliente pode ficar feliz, mas os concorrentes vão abandonar a plataforma devido a alta concorrência, então é preciso garantir um equilíbrio, sem perder todos os fornecedores.

O efeito cruzado é quando o aumento ou diminuição de um dos lados do mercado afeta o outro positiva ou negativamente. Se existem muitos clientes e poucos fornecedores, podem existir um limite de fornecimento, como as empresas possuem limitação física de fabricação e distribuição, os clientes ficam insatisfeitos com as demoras e saem da plataforma. O gestor da plataforma deve então fomentar que mais fornecedores participem da plataforma.

No caso do Uber o mercado para os motoristas está atrativo, então mais motoristas buscam a plataforma, mas conforme o mercado de clientes alcança a saturação o tempo de espera de cada motorista aumenta e sua renda diminui, fazendo com que alguns motoristas abandonem a plataforma.

Observe que alguns destes efeitos não podem ser controlados e devem ser deixados para alcançar o equilíbrio naturalmente, contudo outros efeitos podem e devem ser regulados para evitar que a plataforma não agregue valor aos participantes e desapareça.

Onde está o valor?

Eu já falei que o valor está nas conexões entre os atores, mas para deixar claro acho importante ressaltar que o valor está nas comunidades, ou seja, nos atores da rede e suas conexões. A razão pela qual o Instagram foi vendido para o Facebook por US$ 1 bilhão não foi por causa de seus 13 funcionários. A razão pela qual o WhatsApp foi vendido por US$ 19 bilhões não foram seus 50 empregados. A razão do valor destas empresas está no efeito positivo de rede que conseguiram criar.

Este efeito de rede não está dentro da empresa e sim foram dela, pelo simples fato de que, mesmo para a maior das empresas, existem muito mais pessoas fora dela do que dentro.

Se você é um gestor que continua olhando para dentro da sua empresa, então está na hora de olhar para fora, e esta é a razão pela qual algumas expressões são cada vez mais frequentes no dia-a-dia organizacional: network, open innovation, startups, outsourcing, ecossistemas de inovação, smart cities, IoT, etc. Se alguns destes termos não está claro para você eu lhe encorajo fortemente a buscar conhecimento e entender o que cada um deles significa.

Ainda temos muito o que discutir, aprender, pesquisar e implementar sobre plataformas, mas acredito que este artigo é um passo inicial para você entender o que é uma plataforma, como ela está mudando o mercado e porque ela deve ser tema dos debates estratégicos nas reuniões organizacionais.

Agora quero ouvir a sua opinião, qual o destino da sua organização neste novo universo de negócios “plataformizados”?

Quer saber mais sobre o tema, entre em contato.

Texto baseado em (PARKER, ALSTYNE, VAN e CHOUDARY, 2016)

PARKER, G. G.; ALSTYNE, M. W. VAN; CHOUDARY, S. P. Platform Revolution: How Networked Markets Are Transforming the Economy – And How to Make Them Work for You. [s.l.] W. W. Norton, Incorporated, 2016.